22.8.06

Saúde em perigo

O mar na praia de Buarcos foi interditado ao público por perigo à saúde, devido a conspurcação fecal da água. Conhecendo as condições locais, até admira como isto não aconteceu antes. “Num país da CEE, isto é intolerável!”, dizia um turista italiano, alto e bom som. Há que corrigir o que está mal naquela zona, e isso vai custar dinheiro. Já devia ter sido feito, e embora estejamos sempre a tempo, agora já é tarde.
A saúde pública custa dinheiro, tem que se gastar para a obter, e para a manter. Os gastos nessa área são recompensados, pois a saúde é um dos pilares fundamentais duma sociedade feliz e produtiva. O não se querer gastar na saúde tem sempre, a curto, médio e longo prazo, maus resultados, eventualmente até desastrosos, porque por vezes é difícil refazer o que foi desfeito.
Em termos de saúde, o mote obsessivo do nosso governo é poupar. Quando fala em poupar, invariavelmente é na saúde. Que no nosso país, note-se bem, está perfeitamente ao nível da qualidade europeia comunitária. Veja-se que no último relatório da Organização Mundial de Saúde sobre sistemas de saúde dos vários países do mundo, o Serviço Nacional de Saúde português aparece em 12º lugar (a contar da frente, não dos últimos…), sendo o 5º na Europa, com a Inglaterra em 18º e os Estados Unidos da América a ocuparem apenas o 37º lugar. Que outra actividade estatal neste país tem uma “performance” (como agora se diz) semelhante? E com uma despesa global (público e privado) dentro dos valores europeus comunitários: uma percentagem (9,6 %) do PIB abaixo dos valores mais elevados lá referidos, e um valor absoluto, 1700 dólares “per capita”, mais baixo que qualquer um dos outros. Quer dizer, gastamos menos, por cabeça, para ter uma saúde melhor que a maior parte deles; apenas, como o nosso Produto Interno Bruto é baixíssimo, esse gasto aparece estatisticamente como uma percentagem relativamente elevada. Quer dizer, somos um país pobre com uma saúde de qualidade igual à dos ricos.
O gasto, portanto, tem compensado. É claro que nada é imutável, e é sempre possível fazer as coisas de modo diferente, até mais baratas e melhores. Mas a obsessão da poupança é má conselheira, como qualquer obsessão, principalmente numa área tão sensível e tão importante para o bem-estar das populações como é a saúde. Poupar a todo o preço não é medida que dê resultado, até porque a medicina que fica mais barata é a boa medicina, e para essa são precisos médicos com boa formação, bem treinados, ajudados por outro pessoal de saúde bem preparado, e todos com boas condições de trabalho. Para isso tudo é preciso gastar dinheiro.
O governo tem feito mudanças e tomado medidas, quase só no sentido restritivo, de racionamento de meios, de diminuição de serviços, de hospitais, do número e diferenciação dos profissionais, e do pagamento do seu trabalho. E, apesar disso, a despesa continua a subir, provavelmente pelos encargos administrativos e burocráticos que acompanharam essas medidas. A responsabilidade na Saúde é do Ministro da Saúde, e do Primeiro-Ministro, aguardemos o que se vai passar nesse campo. Modifique-se, inove-se, mude-se, mas mantenha-se pelo menos um Serviço Nacional de Saúde em 12º lugar no mundo em qualidade.
Veremos em que posição vamos estar no próximo relatório da OMS. É que se o objectivo essencial for poupar, então deveremos procurar atingir a Libéria, que gasta apenas 4,7% do PIB e 17 dólares por cabeça. Saúde mais barata não há… (Pub. As Beiras, 24/8/06)

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