26.8.17

António Arnaut, os médicos e a Saúde no seu tempo

Carlos Costa Almeida

Nasci como cirurgião ao mesmo tempo que o Serviço Nacional de Saúde, e temos feito juntos o nosso caminho. Por isso António Arnaut sempre fez parte do meu imaginário enquanto especialista hospitalar, ele e a sua equipa, eles e alguns que os antecederam lançando bases e ideias, e muitos que, do seu partido ou doutros, lhes souberam dar continuidade. Até hoje. 

Mas mal imaginava eu, no Verão quente de 1975, jovem médico terminando o internato policlínico e enviado para o primeiro Serviço Médico à Periferia, a importância de que esse Serviço se iria revestir na organização sanitária do nosso país. Nessa altura achava – e a lógica, apesar de tudo o que depois se passou, continua a parecer-me presente – que seria apenas populismo enviar médicos inexperientes para zonas sem cuidados médicos organizados, em vez de criar verdadeiros hospitais periféricos, povoando-os com especialistas, e só depois lá colocar médicos em fase de aprendizagem. Mas não contava com duas coisas: o estado paupérrimo em termos de cuidados de saúde básicos nos territórios do interior, em necessidade absoluta de ajuda, por um lado, e, por outro, o espírito entusiástico e empreendedor da juventude destacada durante alguns anos para fazer aquele serviço. Sem dúvida que foi um pontapé de saída que ajudou a gizar mais tarde o SNS, depois de levar de imediato saúde a quem dela muito necessitava.

E o SNS não seria o que é sem as Carreiras Médicas, já que foi por elas que os tais hospitais periféricos se foram organizando e povoando com especialistas, que jovens médicos passaram a ir para lá continuar a sua aprendizagem, supervisionados, e que, assim, na realidade se estabeleceu o que a mim me parecia, em 1975, ser o primeiro passo a dar. As Carreiras, a que dediquei uma boa parte da minha vida, constituíram uma estrutura hierarquizada baseada na competência e na experiência, reconhecidas e avaliadas, e foram o suporte para que no SNS se possa ser tratado com igual qualidade em qualquer parte do país.

Não há dúvida que o Dr. António Arnaut, hoje um amigo, esteve sempre presente na Saúde portuguesa depois de ter tido a coragem de fazer promulgar a lei do Serviço Nacional de Saúde. Nunca o abandonou, seguindo de perto o seu estabelecimento e crescimento, com a participação e o entusiasmo doutros políticos e de muitos profissionais que o tomaram como deles e nele se empenharam. E diga-se que é com orgulho que me incluo, com tantos colegas, nesse grupo, um grupo vasto que contribuiu para fazer do SNS português um dos melhores serviços públicos de saúde do Mundo.

Associação Portuguesa dos Médicos de Carreira Hospitalar,
in António Arnaut, Fotobiografia, 2017, ed. MinervaCoimbra