8.11.07

"O SNS ESTÁ A SER DESTRUÍDO"

O Dr. António Arnaut prometeu lutar pelo SNS e pelas Carreiras Médicas "até que a voz lhe doa", na altura da entrega do Prémio Corino de Andrade, no Porto, que lhe foi atribuído pela Secção Regional do Norte da OM e que foi criado com o intuito de distinguir personalidades que prestigiaram os médicos e a medicina portuguesa.
"Sinto-me honrado!" Foi esta a primeira reacção do Dr. António Amaut ao ser agraciado com o Prémio Corino de Andrade, instituído pela Secção Regional do Norte da Ordem dos Médicos.
"Sou um pouco avesso a prémios, mas todos nós gostamos que vejam reconhecido um trabalho que é feito pelo bem comum", admitiu, na cerimónia de entrega do Prémio, que decorreu no mês de Outubro, no Porto.
O Dr. António Arnaut recordou como "este advogado da província", que estava inicialmente designado para ser Ministro da Justiça, acabou por ser nomeado Ministro dos Assuntos Sociais, no Governo do Dr. Mário Soares, "porque não havia mais ninguém que aceitasse o cargo".
No desempenho das suas funções, acabou por ser responsável pela criação do Serviço Nacional de Saúde, inspirada por "um espírito de humanismo e de solidariedade". Segundo o próprio, "o SNS decorria mais de uma exigência ética do que de qualquer imperativo ideológico".
Embora assuma a responsabilidade política, não esquece que, em termos técnicos, "o grande obreiro do Serviço Nacional de Saúde foi o Prof. Gonçalves Ferreira, que, em 1971, começou a delinear o SNS com a criação dos primeiros centros de saúde".
Não deixa de ser curioso que, depois de ter sido o "pai" do Serviço Nacional de Saúde, o Dr. António Amaut se tenha transformado no seu advogado, lutando afincadamente contra "aqueles que o querem destruir".Entendendo que "a igualdade na saúde faz parte da dignidade humana", o antigo Ministro dos Assuntos Sociais entende que os problemas com o financiamento devem ser resolvidos "de forma razoável" e que "não se pode acabar com a maior reforma social do século XX português". Sem querer renovar as críticas à política seguida por este Governo contra o Serviço Nacional de Saúde, quando "era suposto defendê-lo", o Dr. António Amaut conta que apelou várias vezes a um "pacto entre as várias forças políticas, no sentido de garantir este direito fundamental dos portugueses". Pelos vistos, sem sucesso. Ao aceitar o Prémio Corino de Andrade, distinção que pensa merecer, pois o seu objectivo foi "prestar um serviço à comunidade, ao povo e à medicina", o advogado, poeta e ensaísta assumiu a responsabilidade de "continuar a trabalhar e a fazer tudo para servir a saúde". E acrescentou, emocionado: "Quase fazendo um juramento de Hipócrates, digo que continuarei a lutar até que a voz me doa. Mas, às vezes, não é a voz, é a alma que me dói. Continuarei a levantar a minha voz em defesa dessa grande causa que é o Serviço Nacional de Saúde".
O desafio é enorme. "O SNS está a ser esvaziado e degradado e, porventura, destruído, por vezes de forma subtil, subliminar, porque uma das bases do SNS são as carreiras profissionais, não são tarefeiros! As carreiras foram uma conquista da classe médica e são o fundamento, a base, a sustentação humana do SNS. Isso está a ser destruído", denunciou.
Ainda assim, entende que é preciso manter a esperança: "O futuro é sempre um navio que vai chegar".
No final da cerimónia, o Dr. António Amaut ofereceu dois livros à Secção Regional do Norte da Ordem dos Médicos, um dos quais de poemas. "O Serviço Nacional de Saúde foi um poema que escrevi, naquela altura, porque era preciso ser um pouco idealista", confessou.
De referir que, não podendo estar presentes, houve várias instituições nacionais que quiseram associar-se à entrega deste prémio, designadamente a Ordem dos Advogados, a Ordem dos Enfermeiros, as Administrações Regionais de Saúde do Norte e do Centro, a Universidade de Trás-os-Montes e a Bial.
Ainda nos seus tempos de estudante, o Dr. António Amaut participou activamente nos movimentos de oposição ao Estado Novo. Licenciou-se em Direito em 1959. Foi co-fundador do Partido Socialista. Em 1978, ocupou o cargo de Ministro dos Assuntos Sociais do II Governo Constitucional, tendo estado envolvido na Lei que criou o Serviço Nacional de Saúde. Na década de 80, abandonou a política activa. Ultimamente, tem-se dedicado à escrita, tendo publicado recentemente um romance baseado em histórias verídicas.
Pub. Notícias Médicas, 7 Nov 2007

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