4.11.17

Cidades que crescem com a Saúde, Saúde que decresce com a cidade

Coimbra já não tem tamanho, não vale a pena...!”
Ouve-se e lê-se a cada passo nesta cidade que Coimbra não tem tamanho para ter tantas instituições de saúde como tem. Ou melhor, como teve. Felizmente que há quarenta anos atrás Bissaya Barreto não pensava assim, e com ele outros homens de visão – entre eles o recentemente falecido Dr. Viriato Namora -, que idealizaram e ergueram, já contra a vontade de alguns coimbrinhas da altura, o Centro Hospitalar de Coimbra (CHC). A acrescentar ao Hospital da Universidade, não em vez dele ou contra ele. Como mais um argumento, e poderoso, para a Saúde em Coimbra. Que não prejudicou o HUC, antes levou indirectamente, por comparação das condições na altura entre ambos, à construção do seu actual edifício, construído com o CHC em pleno funcionamento. Passou a haver dois hospitais centrais, para além dum hospital especializado, escolas de enfermagem, institutos de investigação, escolas ligadas à saúde, muitos médicos e muito outro pessoal de saúde e, claro, muitos doentes. O que acabou por levar Coimbra a merecer o título de “capital da Saúde”. Foram sem dúvida Bissaya Barreto e os seus colaboradores quem lançou as raízes para que isso pudesse um dia tornar-se realidade. Quarenta anos depois tudo agoniza… porque não vale a pena…
Coimbra tem 150.000 habitantes (se contarmos com a margem esquerda, embora alguns coimbrinhas não a incluam ou, pior, achem que são só “arredores”...), deixou de ser a terceira cidade do país em população, que nela tem vindo a diminuir. Vive da Universidade (com 25.000 alunos), que tem sofrido o embate doutras universidades recentemente criadas, e da Saúde. Esta tem visto a sua capacidade instalada ser posta em causa, e progressivamente reduzida, por se achar que com a cidade a diminuir de tamanho a Saúde também tem de diminuir. A cidade não merece tanta capacidade instalada… para pouca gente…. Não vale a pena…
Cambridge, cidade universitária de Inglaterra com 124.000 habitantes (menos 26.000 que Coimbra), dos quais também 25.000 são estudantes da Universidade fundada em 1209, a quarta mais antiga do mundo, por onde passaram e trabalharam 37 prémios Nobel. Sem grande comércio, vive sobretudo da sua Universidade e da Saúde. Indústria, apenas a ligada directamente à investigação universitária, em especial no campo informático e bioquímico. Tem três grandes hospitais públicos e vários privados, e um campo de saúde recheado de escolas e de muitos institutos nessa área, que atraem gente de todo o mundo, médicos, investigadores, doentes, servidos por uma grande rede de hotéis e bons transportes (entre eles um aeroporto). A apenas 80 km da capital, Londres, com 14 milhões de habitantes e 73 hospitais. Um terceiro foco de rendimento da cidade é o turismo, tal como acontece com a sétima cidade universitária mais antiga do mundo: Coimbra.
Rochester, no Minnesota, Estados Unidos da América, tinha apenas 13.700 habitantes em 1920 quando foi lá criada a Clínica Mayo, hoje uma das mais prestigiadas instituições de saúde do mundo. Actualmente a cidade tem 106.000 habitantes, com dois grandes hospitais gerais e vários especializados, num total de 2.100 camas e 33.000 trabalhadores só no campo clínico. A cidade cresceu com a Saúde e vive exclusivamente dela, com os profissionais e doentes que se deslocam de todo o mundo para lá trabalharem, aprenderem e tratarem-se, e de tudo o que está com ela relacionado. Para os habitantes da cidade, um dos hospitais da Clínica tem uma ala exclusivamente reservada.  
Quer dizer, algumas cidades crescem com a Saúde, juntam esforços, recursos económicos, tecnológicos e humanos, conhecimento (42 % da população de Cambridge tem formação superior), know-how, hospitais e doentes, para poderem ser verdadeiras “capitais da saúde”, com tudo o que isso traz de bom para as próprias cidades e seus habitantes. Coimbra, pelo contrário, querem que definhe acompanhando a sua diminuição de tamanho, pretendem que a Saúde se reduza ao nível da sua baixa de população, dizendo que não vale a pena ser maior do que o tamanho cada vez menor que tem...  Numa espiral descendente que não augura nada de bom!
Mas se houve em Coimbra gente grande que soube prever e projectar o futuro, esperemos que volte a haver. Em tempo útil, antes que a cidade se torne em apenas mais uma capital de distrito deste país, com a Saúde correspondente.
Carlos Costa Almeida
Cirurgião, Professor da Faculdade de Medicina de Coimbra
In Diário de Coimbra, 3 de Outubro de 2017, pág. 14

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